sábado, maio 20, 2006

PELA PRIMEIRA VEZ NA HISTÓRIA...


Quantas vezes você já escutou essa frase de algum representante do governo Lula: "pela primeira vez na história deste país.... fizemos isso e aquilo..."? De maneira geral, é sempre um risco fazer esse tipo de afirmação em qualquer área de atuação governamental. Na área ambiental, então, é temerário. Tem muita gente inovando há bastante tempo, já. Além disso quase tudo que se faz é continuação de algo que alguém já fez, dentro e fora do governo.

Tive que explicar isso ao Secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, Capobianco, na semana passada, no seminário do IPAM sobre a Amazônia, em Brasília. Ele afirmou que o esforço do governo Lula em gerenciar o impacto da BR 163, (Cuiabá-Santarém), com a criação de áreas protegidas e ações de ordenamento fundiário, foi uma iniciativa pioneira na Amazônia. Nunca aconteceu isso antes, disse ele, ou seja, pela primeira vez na história do país, etc

Na verdade, a primeira vez que o impacto de uma estrada foi discutido na Amazônia foi com o asfaltamento da BR 364, no trecho São Paulo - Cuiabá, quando a ABA - Associação Brasileira de Antropologia, fez o governo militar reconhecer os grupos indígenas que seriam afetados e regularizar seus territórios. O famoso massacre dos Nambikwara ficou conhecido no país e no mundo e representou o confronto dos antropólogos com o governo em função do asfaltamento de uma estrada.

Mas foi no segundo trecho da mesma rodovia, a 364, entre Porto Velho e Rio Branco que o maior confronto eclodiu. O BID, financiador da estrada, estabeleceu inúmeras medidas mitigadoras, ambientais e sociais (um projeto ainda hoje considerado exemplar dentro do Banco), em 1985! O governo brasileiro, embora tenha assinado o contrato com essas exigências, achou que não precisava cumpri-las porque ninguém iria cobrar. Acontece que Chico Mendes foi a Washington, cobrou e assinou uma sentença de morte ao assim fazer por contrariar fortes interesses no Acre. Chico foi assassinado. As terras indígenas foram criadas e as reservas extrativistas também. Ou seja, medidas mitigatórias de impacto de uma estrada na Amazônia estão diretamente relacionadas com o assassinato mais famoso do mundo - não se pode esquecer isso! E também com medidas fundamentais que evitaram a expulsão de muitas famílias e deram origem à política de áreas protegidas de uso sustentável, na figura das reservas extrativistas.

A única diferença, é bom que se diga, é que ninguém precisou ir a Washington para pressionar o governo brasileiro a cumprir a lei que determina a mitigação de impacto de obras desse tipo. Mas também, já não era sem tempo!

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