terça-feira, novembro 27, 2007

A AMAZÔNIA DO MEIRELLES

Oindigenista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior ganhou o Prêmio de Meio Ambiente do MMA na categoria liderança individual.

Quando idealizamos o prêmio, Ana Lange e eu, pensamos em pessoas como Meirelles, Raimundo de Barrros, Padre Paulino. Não somente porque são pessoas especiais, com histórias de vida inimitáveis, mas também porque o prêmio poderia fazer diferença na vida delas ou nos projetos que desenvolvem. Pessoas que constróem uma história pelo simples fato de que não poderiam deixar de fazê-lo.

Sou uma pessoa de sorte. Aprendi a conhecer a Amazônia pelas mãos e sabedoria do Meirelles. As fotos são de quando o conheci, em 1978. Na mesinha da janela, na casa da Cadeia Velha, em Rio Branco, onde morávamos todos - Toninho Pereira Neto, Ronaldo Oliveira, Tony Gross e no alto Iaco, acima da TI dos Machineri e Jaminawa, onde Meirelles era chefe de posto.

Na Cadeia Velha ele me ensinou a preparar a pesquisa de campo que fiz no seringal Alagoas, o que observar, o modo do seringueiro pensar, falar, agir. Foi ali que comecei a minha socialização na Amazônia. Eu vinha prá casa, todos dias, feliz com as descobertas que havia feito com as minhas entrevistas para a tese. Encontrava Meirelles, Ronaldo e Toinho às voltas com as emergências nas aldeias - índia com problema de parto que precisava de avião, criança doente, outro que havia tido acidente. Quase sempre me sentia ridícula e inútil. Prá mim tudo se resumia ao prazer intelectual do conhecimento, da pesquisa, da descoberta. Eu não tinha o menor senso de urgência em relação à sobrevivência, não sabia o significado de sobreviver na mata, de enfrentar conflitos de demarcação de territórios, de confronto com grilheiros.

Eles eram iguais a mim, urbanos, vindos de outras partes do país, eu pensava. O que nos fazia tão diferentes? Aprendi ali, na Cadeia Velha, uma lição importante. A sobrevivência das pessoas, em situação de conflito, depende de respostas imediatas, urgentes, das pessoas que estão ali naquele momento e não de políticas, articulações ou contatos. Essas estratégias são importantes, mas não adianta nada se aquelas pessoas não conseguirem sobreviver.

Fui visitá-lo na aldeia, pegamos o barco e subimos o Iaco, uns dois dias, quase perto da fronteira com o Peru. Era a primeira vez que eu ia a uma aldeia indígena, a primeira vez que andava por rios distantes, silenciosos e misteriosos. A primeira vez que saía de casa sem saber onde, quando, como, iria me alimentar ou dormir.

Eu pensava que íamos apreciar a natureza, conversar, trocar experiências, filosofar. Mas Meirelles passava o dia todo pescando ou caçando e de noite salgando o peixe ou a caça. E eu ali, observando, ajudando um pouco - inútil, novamente, na medida em que não sabia caçar, pescar ou cozinhar. Entendi tudo quando chegamos de volta na aldeia. Quando Meirelles distribuiu o que caçou e pescou e ficou com uma parte, entendi tudo. Passaria pela cabeça de alguém, naquela sociedade, sair para o alto rio, por três ou quatro dias, e voltar sem comida para trocar?

UTOPIA PECULIAR

Meirelles é chefe da Frente de Proteção Etno-Ambiental do Rio Envira, na fronteira do Acre com o Peru. Está lá desde 1988. Se alguém pensa que essa é uma opção profissional para quem é indigenista, ou é o lugar certo prá quem não gosta de civilização, não entende as motivações do Meirelles. É claro que eu penso que entendo, o que não quer dizer nada, na verdade. Mas arrisco acertar com base em registros que fiz de algumas de suas conversas.

Visitei Meirelles no Envira em 2000. Depois de uma longa viagem até o Acre, um vôo de avião fretado até a antiga fazenda Califórnia, no rio Envira, um dia quase inteiro de batelão e um outro dia de voadeira, chegamos num paraíso. Meirelles mora numa linda casa de seringueiro que ele modernizou, com água encanada, energia solar, um banho maravilhoso e um freezer com cerveja gelada que não existe. Juliano, meu filho, chegou de Nova York direto em Rio Branco e, de lá, no Envira. Vicente Rios que, junto com Adrian Cowell também ganhou o prêmio Chico Mendes, filmou.

O que quer Meirelles. Acho que ele é o último indigenista. O cara que realmente acredita no que faz e é sincero. Já foi atacado, pelo menos, três vezes. E volta lá não só porque mora lá ou porque lá é o seu trabalho. Ele volta porque ele acredita em um modelo novo de contato.

Meirelles tem a missão de impedir que os brancos cheguem perto da área dos isolados e afastar os isolados do contato com os brancos. E faz isso, no alto Envira, há 20 anos. Meirelles acredita que é possível manter esse grupo sem contato - que ele acha que é da língua Pano - pelo menos, mais dez anos. Com a interdição da área, a retirada de seringueiros onde possam ocorrer conflitos e a instalação de um outro Posto de proteção, dá prá ficar tranquilo. A área onde estão esses índios faz parte de uma reserva já demarcada, cercada de várias outras reservas. Assim, os riscos de contato são muitos pequenos. Se ele conseguir espalhar o boato de que não existe mais ninguém ali, morreram todos, dá prá aguentar mais dez anos.

E daí, o que poderá ocorrer durante esse tempo, ou depois? Meirelles pensa nisso quando deita na rede todas as noites. Durante um tempo, ele viveu muito precariamente ali. Agora, tem um motor, um freezer, dá prá tomar uma cerveja gelada e escutar Vivaldi, no final da tarde, quando termina o trabalho da sobrevivência. A Funai não tem dinheiro, assim, ele tem que garantir sua própria roça, tem que pescar, caçar e cuidar de sua vida sem esperar dinheiro de fora.

É nessas horas que ele fica pensando sobre suas utopias. E se os índios fizerem contato? E se ele pudesse fazer um contato planejado e sem riscos. Primeiro, ele precisaria saber falar a língua, porque fazer contato tendo um outro índio como intérprete, é sempre muito arriscado. Nunca se sabe se o que está sendo traduzido é exatamente o que está sendo falado. Além disso, precisaria de dez anos para ensinar, devagar, que, ao mesmo tempo que os brancos têm o terçado, também deixam o nariz do índio correndo, porque trazem doenças que matam. Ensinar com as categorias da cabeça deles.

Fica imaginando como é a cabeça de um índio sem contato. Sabe que é observado permanentemente e que eles devem se experts a respeito da rotina do Posto e conhecer detalhes da sua vida pessoal. Sente-se observado. Mas não quer contato. Não acredita que seja possível sobreviver a um contato.

E sabe de experiência própria. Meirelles participou da atração dos Guajá, no Maranhão, numa época em que a Funai não tinha procedimentos tão elaborados em relação aos índios "arredios". O contato acontecia quando as ameaças já estavam tão perto, os índios tão acuados que era a última alternativa para tentar evitar o completo desaparecimento do grupo. Ele participou da frente de atração dos Guajá, e essa foi a primeira experiência dele como indigenista, em 1973. Hoje, os Guajá estão completamente aculturados. Existem ainda alguns pequenos grupos sem contato, mas já é um caso de resgate, porque não é mais uma sociedade, mas apenas alguns indivíduos, soltos, para os quais não há outra alternativa.

As roças dos índios sem nome estão muito perto do local onde os seringueiros moram e estes vão caçar muito perto das aldeias. Os conflitos são inevitáveis e é melhor tirar essas pessoas de lá para poder deixar os índios em paz.

E isso é possível, e tem sido ainda mais fácil nos últimos anos. A queda da borracha esvaziou o rio Envira. Desde 1992 a crise da borracha se espalhou e os seringueiros foram para Feijó. Moram na periferia, em completa miséria. Na mata só ficaram alguns velhos que vivem, hoje, como os índios, caçando e pescando prá sobreviver. Em Feijó, nos últimos meses, já mataram três velhos aposentados do Funrural prá roubar a minguada pensão que eles recebem. Do Seringal Canadá prá cima, só ficaram os índios. Da Fazenda Califórnia, já no alto Envira, não sobrou nada. Os Kulina tiraram toda a madeira que havia nos barracões da fazenda e construíram várias casas, cobertas de zinco, na beira do rio. Parece um conjunto habitacional. A crise da borracha ajuda a manter o que ainda existe da sociedade indígena, ao menos por mais algum tempo.

E o que vai acontecer depois? Meirelles acha que se for possível assegurar mais dez anos do jeito como está, terá valido a pena. Mas o destino, depois, será igual ao dos demais: uma integração de alto custo, com mortes por doenças, até que o que sobrar acaba se aculturando.

A não ser que um idiota resolva se arriscar a fazer contato por conta própria, convencido de que o povo que vive no Posto da Funai não representa perigo, um fato comprovado nos últimos vinte anos, desde que Meirelles chegou ali. E se isso acontecer, o que ele gostaria era de poder falar a língua. Perguntei se está aprendendo. Disse que não, mas que essa era uma boa idéia. Poderia começar a se preparar para esse contato e, quem sabe, realizar sua utopia e fazer um contato sem traumas, pela primeira vez na história da humanidade.

Como ele diz, tudo isso parece história de ficção. Um povo que vive desde sempre longe de nós, que nunca se comunicou conosco, que tem uma tecnologia da idade da pedra, em plena passagem do milênio. E apesar de toda a tecnologia que existe hoje no planeta, ainda não descobrimos aquela que poderia ensinar ao outro como dominar o que temos de melhor e evitar as desgraças que vêm junto no pacote. Nem eles têm experiência de lidar com coisas tão maravilhosas como uma espingarda, um motor, luz elétrica, lanterna, fósforo e entender que o fascínio pode significar a morte.

Brasília, 10 de abril de 1998 atualizado em Curitiba, 27 de novembro de 2007.

Não está na hora de escrever essas histórias com o jeito particular que você tem de contá-las, Meirelles?

segunda-feira, novembro 26, 2007

JOÃO BATISTA CONTINUA DESAPARECIDO

Paulo Jasiel enviou essa foto e um depoimento de João Batista Ferreira, de novembro de 2004. Ele é líder comunitário e um dos principais responsáveis pela criação da da Reserva Extrativista do Jutaí, município de Jutái, Estado do, Amazonas. João Batista está desaparecido desde o dia 11 quando saiu de sua casa para ir ver uma roça comunitária.

"O ser humano é um monstro muito grande. Come tudo. O ser humano destrói tudo. Por isso precisa que haja a lei. Foi por isso que Deus criou as leis naturais. As leis naturais dizem o seguinte: Não entra no fogo, porque se tu entrar, tu morre queimado. Não pula na água se não sabe nadar, por tu afunda e morre afogado. Não trepa numa árvore alta e se segura num galho fino, porque o galho quebra, tu cai no chão e se esborracha tudinho. Não fica no meio da chuva com um ferro na mão porque vem um raio e te mata. Então por aí afora, tem muitos detalhes.

Baseados nessas leis que o homem criou suas próprias leis para disciplinar esse grande monstro que é a humanidade. Disciplinar e administrar a humanidade. O ser humano motivado por necessidade, ele destrói o ambiente e degrada a natureza. Por todos os modos, ou por ganância, ou por necessidade. Mas nós temos que entender que a ganância e a necessidade existem outros meios para se substituir. Agora nós temos que ver que nada justifica nós depredar a natureza por esses motivos. Mas o homem é tão perigoso... Que você vê um pobrezinho e diz: "Coitadinho"... Mas ele destrói a natureza. Isso não justifica a destruição da natureza porque ela é lenta e custa a se recuperar e muitas vezes ela não se recupera. Então, é aí que entra a lei, prá proibir o coitadinho e o ganancioso. Porque a humanidade precisa dessa natureza.

Estão sendo criadas na Amazônia muitas unidades de conservação. É lógico que isso é muito importante para o nosso paí­s e para a nossa futura geração, porque se não fizermos isso hoje, amanhã será muito tarde. Porque haja visto, tanto os coitadinhos e os gananciosos estão comendo a floresta irresponsavelmente. Agora, acontece que as populações que têm nessas unidades de conservação, elas fazem parte dessa população de coitados, pobres, deserdados que fazem isso tudo pela necessidade e motivado pela desinformação social e econômica, que eles são. Mas com certeza, é possí­vel sim reverter esse quadro. É claro que não no imediato, mas havendo um investimento social, econômico e educacional é possível a longo prazo reverter esse quadro, transformando esse simples coitadinho, predador, num grande cidadão, cumpridor do seu dever e capaz de contribuir e reconstruir o seu ambiente e valorizar com certeza a mãe natureza. Como fazer isso?

Primeiro. Juntando os indiví­duos, haja visto que eles vivem em colocações longe uns dos outros, isolados de tudo. Juntando em comunidades de 5, 10, 15 famí­lias. A partir daí­ se fazer um trabalho de apoio à vida e à cidadania. Como?

Melhorando os seus meios de trabalho, as suas ferramentas, investindo na produção da roça, da agricultura, fazendo com que ele saiba produzir produtos extrativistas com qualidade, tal como a borracha, óleo de andiroba, copaí­ba, mel de abelha, e produtos artesanais paneiro, tipiti, tupé, aturá, jamachim, remo, canoa, melhorando a sua qualidade e produtividade agrí­cola de subsistência. Como no plantio de mandioca, farinha de qualidade, plantando cará, macaxeira, banana, cana, ananás, abacaxi, fruteiras, caju, beriba, mari, ingá, limão, enfim, todo tipo de fruteira na comunidade, plantio de hortaliça, chicória, cebola de praia mesmo. Tudo isso, melhora em primeiro lugar a saúde do homem porque ele passa se alimentar com qualidade, comendo frutas e verduras. Com certeza!

Segundo. Investir na educação escolar, de jovens adultos e crianças, para que ele possa descobrir os valores da arte da matemática e das letras e assim ele possa administrar com resultado a sua produtividade. Com isso, gerar renda sustentável para a sua famí­lia.

E terceiro, investir nos conhecimentos dos valores ambientais que o homem tem ao redor na sua comunidade. Investir na preservação dos lagos, que é um dos maiores valores que o comunitário tem, pois é a base alimentar de suas famílias. O peixe. O produto do lago. Investir nos conhecimentos da preservação dos animais das florestas, dos chupadores, nos barreiros, nos igarapés, pois são criadores dos animais da floresta. Investir nos conhecimentos dos valores que tem a floresta para a biodiversidade e em especial para o homem, pois a árvore é o verde, e sem o verde ninguém veve. Haja visto que é do verde da floresta, do verde, da árvore, é que o homem tem o alimento de toda a sorte, toda a matéria-prima que ele precisa, a madeira, e toda a oleoginosa para o biodiesel, a medicina e o cosmético. E a partir de que o homem da floresta passa a descobrir esses valores da floresta, possa ele mudar de mentalidade e comportamento, passando a contribuir e preservar o meio ambiente nosso de cada dia e transformando-se num grande colaborador da mãe natureza".

terça-feira, novembro 20, 2007

LÍDER SERINGUEIRO DESAPARECIDO

MENSAGEM DO PRESIDENTE DO CNS, MANOEL CUNHA:

"Companheiros e companheiras,

O Estado do Amazonas passa por uma situação dramática. Hoje faz sete dias que João Batista, presidente da Associação dos Produtores Rurais de Jutaí está desaparecido. O mesmo foi visto pela última vez saindo de sua casa às 13:00h do dia 11 deste mês, para olhar uma roça comunitária. E até o presente momento não se sabe o paradeiro dele. Todas as possibilidades de procura foram esgotadas e não foi encontrado nem vivo e nem morto.

O município de Jutaí passa por uma série de problemas políticos, como: processo de cassação do prefeito, candidatura própria do PT, que está com grande chance de vencer a eleição em 2008, grande tráfico de drogas na cidade, apreensão de grandes invasores da Reserva Extrativista do Jutaí, entre outros.

João, por ser uma das maiores lideranças do município, está sempre à frente das denúncias, dos enfrentamentos daquela região. Sempre foi visto como pivô central na luta dos movimentos locais. Por estas e outras razões não se descarta a possibilidade de ter sido assassinado como forma de sufocar a luta dos movimentos locais.

O CNS e outros parceiros estão mobilizando uma ida em Jutaí para fortalecer a luta dos companheiros e prestar homenagem a João, com um grande ato público, no sentido de tornar pública a luta de João nas questões ambientais, sociais e organizativas para o município e todo o Amazonas.

Convido todos e todas para fazer parte desta família no sentido de fazer justiça à memória de João e alegrar nossos irmãos para que a luta continue mais forte em busca de dias melhores às populações das florestas e segurança das nossas lideranças.

Manoel Cunha
Presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros
Carauari, Amazonas, 20.11.2007"

É PRECISO ALERTAR AS AUTORIDADES PARA QUE COMECEM UMA BUSCA IMEDIATA DO PARADEIRO DO JOÃO ANTES DE QUALQUER OUTRA PROVIDÊNCIA.

quarta-feira, novembro 07, 2007

FAS - FÓRUM AMAZÔNIA SUSTENTÁVEL
















UMA COLIGAÇÃO ORIGINAL E INFLUENTE

Está se formando uma coligação - Fórum Amazônia Sustentável - que pode influenciar o futuro da Amazônia. Seus membros vêm da sociedade civil, do setor privado e dos movimentos sociais e a missão é "mobilizar lideranças dos diversos segmentos da sociedade, promovendo o diálogo e a cooperação para construir e articular ações visando uma Amazônia justa e sustentável".

A comissão executiva é formada por: Instituto do Homem e do Meio Ambiente [Imazon], Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social; Instituto Socioambiental [ISA], Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro [FOIRN]; Fundação Avina; Fundação Vale do Rio Doce; Grupo Orsa; Grupo de Trabalho Amazônico [GTA] e Projeto Saúde e Alegria. O patrocínio é da Petrobras, Banco da Amazônia, Alcoa, Fundação Vale do Rio Doce, Natura, Grupo Orsa e Suzano.

O evento de fundação e lançamento está sendo realizado esta semana em Belém (PA) e o Forum será lançado oficialmente amanhã com a presença de autoridades e a imprensa.

Alguns pontos:

1. Existem, certamente, transformações em curso ou já efetivadas na direção da sustentabilidade, nas empresas participantes, que as credencia para criar o forum. No entanto, é preciso que o FAS se dedique a criar um conjunto de indicadores e um sistema de monitoramento para seus membros. A transparência nesse monitoramento é fundamental. Afinal, ONGs e movimentos sociais, com longa história de lutas e conquistas, estão dando um aval e podem contribuir muito nas práticas das empresas. O diálogo é fundamental e ele pode trazer excelentes resultados se for baseado na confiança mútua e no reconhecimento de que muito é preciso ser feito para se ter um padrão social e ambiental adequado na Amazônia.

2. Em si mesmo o FAS já é um espaço de inovação relevante. Dedicar um tempo para conhecer os projetos, os desafios, as expectativas, das instituições que dele fazem parte hoje, já seria uma agenda com grande potencial. Afinal, a partir do conhecimento acumulado ali mesmo, naquelas organizações, já é possível ter um agenda bastante propositiva de mudanças na Amazônia. Investir em seminários de troca de experiências entre os membros, antes de abrir para novos, pode ser um exercício importante.

3. Outro aspecto interessante é a agenda em si mesma. Enquanto o governo está pressionando a área ambiental para que facilite a expansão do agronegócio, dos biocombustíveis, das obras de infra-estrutura, fazendo o MMA se concentrar quase exclusivamente na agenda punitiva e coercitiva, a sociedade civil nada a passos largos em outra direção. Estas iniciativas podem vir a se completar no futuro, mas é bom que andem em paralelo nesse momento. A existência de uma certamente é condição para a existência da outra.

4. Piloto e escala. Será que esse esforço vai começar a romper a barreira do piloto e conseguir a escala tão desejada da sustentabilidade? Precisamos apostar que sim. Durante o PPG7, a maior experiência piloto na Amazônia, a crítica dos doadores era a falta de articulação com o setor privado. Também, havia uma certa escassez de bons parceiros no passado. Hoje, estamos vendo que é possível.

5. Por último, também acho interessante os membros do FAS reconhecerem que estão em processo de mudança em direção a práticas sustentáveis e definir um patamar mínimo a partir do qual a inserção de novos membros será aceita. É preciso saber quais são os critérios de inclusão, quem pode e quem não pode participar. Ampliar, ganhar novos adeptos, consolidar sua influência na região é fundamental. Mas não basta ter um discurso novo e manter práticas arcaicas. E para isso acontecer é fundamental que as empresas que têm seus negócios baseados na exploração dos recursos naturais regionais (madeira, minérios, biodiversidade, agricultura) se disponham a construir essa agenda de mudanças.

VALE A PENA ACOMPANHAR.

sábado, novembro 03, 2007

NEGÓCIOS SUSTENTÁVEIS

Vale a pena comparar
a evolução dos produtos
em 2002 e em 2007

Amazon your business: publicado em 2007 pelo jornalista holandês Meindert Brower em inglês, holandês, espanhol e português, com os seguintes apoios financeiros: Programa ACTO-DGIS-GTZ, Both ENDS, Conservation International, Hivos, Pequeno Foundation, Solidaridad, Triodos Foundation, UN-organisation UNCTAD e Worldwide Fund for Nature WWF. Este guia de bons negócios na Amazônia é o primeiro a incluir produtos sustentáveis oriundos das florestas e rios de todos os países da bacia: Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana e Suriname. O livro apresenta mais de 50 novos produtos: desde cosméticos, óleos aromáticos, sapatos de couro de crodocilo, sacolas de couro vegetal (como a da foto), jóias de ouro, medicinais, bebidas energéticas, salgadinhos, chocolate, suplementos alimentares, objetos, dentre outros. O guia pretende mostrar como o mercado poder contribuir para a conservação da floresta, a cooperação para o desenvolvimento e a eliminação da pobreza. Apresenta entrevistas com ministros, empreendedores, consultores, líderes de organizações internacionais e de ONGs e moradores locais. Uma seção de network com informações sobre companhias e organizações e endereços na web também está incluído no livro. O livro pode ser adquirido neste endereço: http://www.amazonyourbusiness.nl/

Negócios para Amazônia Sustentável: publicado em 2002-2003 pela Secretaria de Coordenação da Amazônia do MMA, PPG7, Amigos da Terra - Programa Amazônia, WWF Brasil, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do RJ e Couro Vegetal da Amazônia/Amazonlife.
Foi a primeira vez que se colocou 69 produtos amazônicos produzidos de forma sustentável, alguns deles parte da publicação holandesa deste ano. Os produtos foram classificados em oito categorias: arte e cestaria indígena, artesanato de sementes e fibras vegetais, castanha do brasil, ecoturismo, madeira certificada e artefatos, novas alternativas para borracha nativa, produtos fitoterápicos e cosméticos e produtos gastronômicos. Apresenta também uma seção de serviços listando as instituições e programas que apóiam negócios para pequenas comunidades e empresários. Cada produto tem foto, história de produção, origem geográfica e social e a edição é muito bonita e caprichada. Pena que não pode ser adquirido porque o livro está esgotado.

Desafios
Alguns produtos que estavam na primeira publicação também aparecem na segunda, como o couro vegetal e madeira certificada, por exemplo. Duas diferenças principais surgiram nesse mercado. A primeira, a inserção de grandes empresas como a Natura; a segunda, a implantação governamental de projetos de grande escala como a fábrica de preservativos em Xapuri, parceria do Governo do Acre com o Ministério da Saúde.

Os desafios continuam grandes: o mercado industrial é pequeno e os volumes bem menores do que as comunidades podem produzir. Assim, sobra óleo de castanha e de murumuru, por exemplo, em duas comunidades que visitei recentemente, na RDS do rio Itarapuru, no Amapá e na Resex do Médio Juruá, no Amazonas. As comunidades melhoraram a renda e a qualidade de vida, criaram e administram infra-estrutura produtiva dentro da floresta de uma maneira que não seria possível sem essas parcerias, mas ainda estamos falando de iniciativas pilotos.

Sair do piloto e entrar em escala que possa beneficiar todas as comunidades amazônicas é uma desafio que requer uma parceria de longo prazo com governos locais, empresas e comunidades. Já está na hora de acontecer!