domingo, abril 20, 2008
CONSUMO SUSTENTÁVEL
Um dos sentimentos mais fortes e pesados de quem começou a trabalhar com meio ambiente e sustentabilidade há mais de 20 anos era a sensação de que tudo dependia do que a gente conseguisse fazer hoje, aqui, agora, amanhã e não havia substitutos. Se você não fizesse, ninguém ia fazer em seu lugar. Isso dava à gente um senso de urgência que colocava todas as coisas em segundo plano. E eu ficava imaginando um tempo em que essas preocupações fossem partilhadas com outros.
Não foram poucas as vezes em que tentei, sem sucesso, comprar móveis para a minha casa que não viessem da Amazônia. Eu ia numa loja aqui em Curitiba e perguntava de que madeira era feita aquela mesa, ou estante, e a pessoa dizia orgulhosa: "é de mogno!" Eu perguntava: "mas de onde vem o mogno?" a pessoa dizia: "ah, não sei, deve ser do Pará..." Não tem de outra madeira? Não, não tinha opção.
Depois veio a fase inicial da certificação que tinha, sim madeira, mas era tão escassa e tão difícil de achar, que você desistia antes de começar a pensar em comprar um móvel certificado. E olhe que isso não faz tanto tempo assim! Em 2000, quando eu quiz fazer uma parede de madeira certificada no meu gabinete em Brasília, na Secretaria da Amazônia, não achei!
Foi por isso que vibrei quando abri o site recém lançado do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (GVces) http://www.catalogosustentavel.com.br
porque ali estão todas as opções disponíveis hoje para comprar um produto que tenha sido produzido de forma adequada. E não somente do ponto de vista ambiental, mas também social, ou seja, para ser incluído no site é preciso que o produtor respeite as leis trabalhistas também.
São produtores brasileiros, em muitos casos pequenas indústrias, que estão entrando nesse novo mercado que, agora sim dá prá dizer, veio prá ficar. Porque no momento em que as opções existem - mesmo que no começo sejam um pouco mais caras - o consumidor poderá fazer uma escolha.
O site é um Catálogo de Produtos e Serviços Sustentáveis. Os serviços ainda não estão disponíveis. Mas há uma infinidade de alternativas que estão lá, disponíveis para você navegar e escolher.
domingo, abril 13, 2008
POLÍTICAS PARA AMAZÔNIA: UM BALANÇO
A queda do desmatamento na Amazônia, por três anos seguidos, em uma conjuntura de mudanças climáticas e pressão internacional, é um fato tão positivo que parece ter ofuscado a capacidade de análise dos gestores do meio ambiente. Difícil entender a surpresa do Ministério do Meio Ambiente – e as soluções convencionais apresentadas – diante da retomada do crescimento do desmatamento, fato previsto por pesquisadores para acontecer assim que os preços das commodities voltassem a subir. É difícil imaginar que alguém tenha acreditado que, sem mudar a estrutura econômica e fundiária da Amazônia, e apenas como resultado da intensificação da fiscalização, teria sido possível alterar o comportamento do desmatamento. Seria a comprovação de que a economia da Amazônia é movida exclusivamente por forças ilegais e que o governo é eficiente, o que não é verdade.
Tanto a surpresa quanto as medidas, acredito, revelam o fim de um ciclo da política do governo Lula para a Amazônia. A ministra do Meio Ambiente iniciou sua gestão propondo a divisão de responsabilidades pela sustentabilidade das políticas ambientais, especialmente para a Amazônia, com todo o governo. Deu a isso o nome de transversalidade. Cuidar da Amazônia não poderia ser uma função exclusiva de sua área na medida em que os problemas centrais – ausência do Estado, desordem fundiária, violência, estímulo a atividades econômicas predatórias – são de responsabilidade de outras instâncias do governo.
Ao final de cinco anos, as políticas para a Amazônia continuam muito parecidas com as do passado: o governo não internalizou a sustentabilidade e o meio ambiente responsabiliza as políticas econômicas pela volta do desmatamento. Mais que isso, houve um reducionismo e as propostas do Ministério do Meio Ambiente ficaram restritas à área na qual tem tradição e que lhe é exclusiva – vigiar e punir. Todo o apoio à ministra neste papel, que é essencial. Mas não se pode reduzir a questão amazônica a isso.
Afinal, o que precisa mudar na política do governo Lula para a Amazônia?
Em primeiro plano, está a questão institucional. Quando cientistas, organizações não governamentais, políticos, apresentam estudos e soluções de desenvolvimento sustentável para a Amazônia, quem, no governo, tem os meios para tornar estas propostas realidade? Ninguém. Todos os instrumentos de política pública (crédito, subsídio, pesquisa, preço) estão voltados para o desenvolvimento convencional, que só prospera às custas da floresta. Cada órgão do governo federal tem uma agenda própria para a Amazônia; cada governo estadual age de acordo com interesses locais. Não existe uma única instituição com mandato, recursos, poder, competência, para coordenar a execução uma política coerente de desenvolvimento para a região.
Outro ponto é descompasso entre vigilância e ação. Os instrumentos disponíveis hoje para monitorar o que acontece na superfície da Amazônia são incomparavelmente mais eficientes do que o aparato destinado a fazer a lei ser cumprida. Ao mesmo tempo em que se criou o Sistema Deter, teria sido necessário organizar estruturas descentralizadas eficientes, ágeis e bem equipadas, prontas para entrar em ação. Afinal, o incremento da vigilância sem resultados efetivos na punição aos degradadores é como um tiro no pé, pois a maior transparência no monitoramento do desmatamento vai gerar apenas mais cobrança por parte da sociedade.
Porém, o aspecto mais importante é a ausência de políticas de desenvolvimento sustentável. O PAS – Programa Amazônia Sustentável, lançado por Lula em Xapuri, no começo do seu governo e que deveria ser o eixo dos investimentos, não saiu do papel. O PPG7, a maior alocação de recursos para a sustentabilidade que já existiu na Amazônia, está chegando ao fim sem nada para ficar em seu lugar. O único programa em curso – a concessão de áreas para exploração florestal – tem um impacto muito reduzido face às forças que estimulam a devastação.
Soma-se ao alcance limitado das políticas, o papel pouco crítico da sociedade civil, principalmente das ONGs, diante da política do governo para a Amazônia. Ou porque dependem de recursos públicos, ou porque não são consultadas, ou porque não querem brigar com pessoas do próprio partido, ou porque, sinceramente, acreditam na determinação e boa vontade da ministra Marina Silva, o fato é que não existe independência na análise da política ambiental. E o "efeito Marina Silva" – de amortecer os erros da política do governo Lula para a Amazônia – pode trazer mais prejuízos do que benefícios para a região no longo prazo.
Mas crise pode significar oportunidade. Retomar as políticas estratégicas é oportuno, especialmente em um momento de grande atenção da mídia e da sociedade.
Primeiro, é preciso "fechar a fronteira". Enquanto existirem terras livres para serem exploradas sem ser necessário se submeter às leis do país, não haverá quem consiga colocar ordem no desenvolvimento da Amazônia, muito menos de forma a torná-la sustentável. Para fechar a fronteira existem dois instrumentos: um, é o zoneamento, que disciplina a destinação de territórios e recursos em nível regional; o outro, é o licenciamento ambiental georeferenciado, que atua em nível de propriedade.
Um macro zoneamento transformado em lei e acompanhado de instrumentos econômicos adequados, poderá conciliar agricultura, pecuária, manejo florestal, reafirmar o papel das unidades de conservação, regular a exploração mineral, assegurar a produção familiar. O sistema georreferenciado de licenciamento ambiental, que utiliza imagem de satélite na escala da propriedade rural, é eficiente e impessoal na aplicação do Código Florestal.
Tendo a fronteira sob controle e regras claras de uso e exploração dos territórios e recursos, o governo deveria convocar todos os setores econômicos, políticos e sociais, para um grande pacto pelo desenvolvimento, inclusão social e sustentabilidade da Amazônia – proposta apresentada recentemente pelas ONGS.
Não se pode reduzir a Amazônia à questão do desmatamento. Ao largo deste debate há uma sociedade que produz inovação e organiza alternativas de renda com as riquezas da floresta; bancos multilaterais buscam oportunidades de investir em projetos certificados; forum de empresários e movimentos sociais se mobilizam por novas políticas; negócios sustentáveis se multiplicam por meio de parcerias entre comunidades locais e empresas – iniciativas que precisam superar um enorme déficit educacional e social que cabe ao governo enfrentar.
Não é preciso mais pesquisa nem soluções mirabolantes. A chave para a Amazônia está em executar – fazer acontecer - as soluções disponíveis na escala adequada. Para isso, existe um fator decisivo: o governo precisa criar uma instância supra-ministerial para coordenar a política de desenvolvimento sustentável da Amazônia, tendo todas as esferas operacionais a ela subordinadas, com recursos e poder político, apoiada em um conselho representativo e respeitado.
O fim de um ciclo de políticas para a Amazônia é hoje marcado pelo imperativo climático. Em um cenário de crescente valorização dos ativos florestais e expectativas mundiais em relação ao que faremos com nosso cobiçado capital natural, uma medida ousada poderá marcar a história de um país.
Tanto a surpresa quanto as medidas, acredito, revelam o fim de um ciclo da política do governo Lula para a Amazônia. A ministra do Meio Ambiente iniciou sua gestão propondo a divisão de responsabilidades pela sustentabilidade das políticas ambientais, especialmente para a Amazônia, com todo o governo. Deu a isso o nome de transversalidade. Cuidar da Amazônia não poderia ser uma função exclusiva de sua área na medida em que os problemas centrais – ausência do Estado, desordem fundiária, violência, estímulo a atividades econômicas predatórias – são de responsabilidade de outras instâncias do governo.
Ao final de cinco anos, as políticas para a Amazônia continuam muito parecidas com as do passado: o governo não internalizou a sustentabilidade e o meio ambiente responsabiliza as políticas econômicas pela volta do desmatamento. Mais que isso, houve um reducionismo e as propostas do Ministério do Meio Ambiente ficaram restritas à área na qual tem tradição e que lhe é exclusiva – vigiar e punir. Todo o apoio à ministra neste papel, que é essencial. Mas não se pode reduzir a questão amazônica a isso.
Afinal, o que precisa mudar na política do governo Lula para a Amazônia?
Em primeiro plano, está a questão institucional. Quando cientistas, organizações não governamentais, políticos, apresentam estudos e soluções de desenvolvimento sustentável para a Amazônia, quem, no governo, tem os meios para tornar estas propostas realidade? Ninguém. Todos os instrumentos de política pública (crédito, subsídio, pesquisa, preço) estão voltados para o desenvolvimento convencional, que só prospera às custas da floresta. Cada órgão do governo federal tem uma agenda própria para a Amazônia; cada governo estadual age de acordo com interesses locais. Não existe uma única instituição com mandato, recursos, poder, competência, para coordenar a execução uma política coerente de desenvolvimento para a região.
Outro ponto é descompasso entre vigilância e ação. Os instrumentos disponíveis hoje para monitorar o que acontece na superfície da Amazônia são incomparavelmente mais eficientes do que o aparato destinado a fazer a lei ser cumprida. Ao mesmo tempo em que se criou o Sistema Deter, teria sido necessário organizar estruturas descentralizadas eficientes, ágeis e bem equipadas, prontas para entrar em ação. Afinal, o incremento da vigilância sem resultados efetivos na punição aos degradadores é como um tiro no pé, pois a maior transparência no monitoramento do desmatamento vai gerar apenas mais cobrança por parte da sociedade.
Porém, o aspecto mais importante é a ausência de políticas de desenvolvimento sustentável. O PAS – Programa Amazônia Sustentável, lançado por Lula em Xapuri, no começo do seu governo e que deveria ser o eixo dos investimentos, não saiu do papel. O PPG7, a maior alocação de recursos para a sustentabilidade que já existiu na Amazônia, está chegando ao fim sem nada para ficar em seu lugar. O único programa em curso – a concessão de áreas para exploração florestal – tem um impacto muito reduzido face às forças que estimulam a devastação.
Soma-se ao alcance limitado das políticas, o papel pouco crítico da sociedade civil, principalmente das ONGs, diante da política do governo para a Amazônia. Ou porque dependem de recursos públicos, ou porque não são consultadas, ou porque não querem brigar com pessoas do próprio partido, ou porque, sinceramente, acreditam na determinação e boa vontade da ministra Marina Silva, o fato é que não existe independência na análise da política ambiental. E o "efeito Marina Silva" – de amortecer os erros da política do governo Lula para a Amazônia – pode trazer mais prejuízos do que benefícios para a região no longo prazo.
Mas crise pode significar oportunidade. Retomar as políticas estratégicas é oportuno, especialmente em um momento de grande atenção da mídia e da sociedade.
Primeiro, é preciso "fechar a fronteira". Enquanto existirem terras livres para serem exploradas sem ser necessário se submeter às leis do país, não haverá quem consiga colocar ordem no desenvolvimento da Amazônia, muito menos de forma a torná-la sustentável. Para fechar a fronteira existem dois instrumentos: um, é o zoneamento, que disciplina a destinação de territórios e recursos em nível regional; o outro, é o licenciamento ambiental georeferenciado, que atua em nível de propriedade.
Um macro zoneamento transformado em lei e acompanhado de instrumentos econômicos adequados, poderá conciliar agricultura, pecuária, manejo florestal, reafirmar o papel das unidades de conservação, regular a exploração mineral, assegurar a produção familiar. O sistema georreferenciado de licenciamento ambiental, que utiliza imagem de satélite na escala da propriedade rural, é eficiente e impessoal na aplicação do Código Florestal.
Tendo a fronteira sob controle e regras claras de uso e exploração dos territórios e recursos, o governo deveria convocar todos os setores econômicos, políticos e sociais, para um grande pacto pelo desenvolvimento, inclusão social e sustentabilidade da Amazônia – proposta apresentada recentemente pelas ONGS.
Não se pode reduzir a Amazônia à questão do desmatamento. Ao largo deste debate há uma sociedade que produz inovação e organiza alternativas de renda com as riquezas da floresta; bancos multilaterais buscam oportunidades de investir em projetos certificados; forum de empresários e movimentos sociais se mobilizam por novas políticas; negócios sustentáveis se multiplicam por meio de parcerias entre comunidades locais e empresas – iniciativas que precisam superar um enorme déficit educacional e social que cabe ao governo enfrentar.
Não é preciso mais pesquisa nem soluções mirabolantes. A chave para a Amazônia está em executar – fazer acontecer - as soluções disponíveis na escala adequada. Para isso, existe um fator decisivo: o governo precisa criar uma instância supra-ministerial para coordenar a política de desenvolvimento sustentável da Amazônia, tendo todas as esferas operacionais a ela subordinadas, com recursos e poder político, apoiada em um conselho representativo e respeitado.
O fim de um ciclo de políticas para a Amazônia é hoje marcado pelo imperativo climático. Em um cenário de crescente valorização dos ativos florestais e expectativas mundiais em relação ao que faremos com nosso cobiçado capital natural, uma medida ousada poderá marcar a história de um país.
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