sábado, abril 29, 2006

COMO ERA VERDE O MEU VALE















The Brazilian Amazon

How green was my valley

Apr 27th 2006 SÃO PAULO
From The Economist print edition

Brazil struggles to put the brakes on rampant deforestation without throwing tens of thousands of loggers and farmers into poverty

“MONSTROUS misery and hunger.” That is the lot of people dwelling in the Amazonian state of Pará since Brazil's government cracked down on loggers and others who earn their livelihoods in the rainforest, says Luiz Carlos Tremonte, who heads a loggers' union. Businesses are idle, thousands are losing their jobs, food aid has not come. The loggers' suffering is no cause for celebration, but to environmentalists the government activism that gave rise to it is.
Brazil loses an average of around 20,000 square kilometres (nearly 8,000 square miles) of rainforest every year. This is because the state lacks the will and the means to control loggers and—more importantly—ranchers, farmers and landgrabbers. This may now be changing. In the year to last August, 19,000km2 of rainforest were destroyed, almost a third less than the 27,000 the year before. “The idea of any country controlling what goes on along an agricultural frontier is completely new,” says Stephan Schwartzman of Environmental Defence, an American NGO.

There are reasons to be wary. Last year's lower rate of deforestation means that the Amazon lost a Kuwait-sized slab of forest rather than nearly a Belgium's worth. This was partly because of a drop in soya and beef prices, the main motors of destruction; when prices bounce back, so may deforestation. The federal government's green contingent is an insecure minority that could be out of office after next October's presidential election. Environmentalism in state governments is even shakier. Yet enough is changing in the way government deals with the Amazon—including new conservation reserves, a new forest law and tougher enforcement—to hope that this marks progress rather than merely a pause in the destruction.

The idea that the Amazon needs saving is relatively new. Mr Tremonte points out that the government once summoned Brazilians to the region to “integrar para não entregar” (integrate the Amazon into Brazil to save it from falling into foreign hands). It remains largely isolated—the main thoroughfares are dirt tracks—but not intact. Nearly 40% of the “legal Amazon”, covering all Amazonian states, consists of protected areas, such as national parks and “indigenous” (Indian) reserves. A quarter is private property, which is supposed to be kept 80% forested but often is not. Most of the rest is unprotected “empty land”, nominally federal property but prey to speculators who assert their claims by despoiling it. Lack of effective ownership often provokes violence: in February 2005, Sister Dorothy Stang, an American nun, was murdered by landgrabbers in Pará.

That prompted the government to send in the army. More effectively, Brazil's president, Luiz Inácio Lula da Silva, has created 150,000km2 of new conservation areas. Earlier reserves were concentrated in remote areas with little attraction for developers. The newest ones stand athwart the “arc of deforestation”—a great swathe of agricultural development, some 400km wide and 3,000km long, that has eaten into the forest—in the hope of discouraging further incursion.

Presidential decrees alone will not disrupt the Amazon's illicit economy, let alone implant a law-abiding and forest-friendly one. That will come from the combined effect of new laws, police operations, regulatory tinkering, institutional reform and pressure by NGOs. Something is happening in most of these areas.

Last year, federal police arrested 148 people in the high-deforestation states of Mato Grosso and Rondônia, a third of them employees of Ibama, the corruption-riddled federal environment agency. Loggers are screaming because the government suspended 3,000 licences to harvest wood on public land. Protocolos—official recognition of a land claim—are now being issued as bar codes rather than as documents similar to title deeds that can be sold or used as collateral for bank loans. That short-circuited the trade in protocolos, a prime tool in land grabbing. As a result, 600,000km2 of land claims have disappeared, says Tasso de Azevedo of the federal environment ministry.

Mato Grosso is better equipped than most states to control deforestation, with a state-of-the-art system for licensing properties and satellite technology to monitor its use. After a purge of the state environment agency, the system is now working well, says André Lima of Instituto Socioambiental, an NGO. But in the areas of enforcement and transparency, there are still problems. Fines are not being paid, nor has the state government put deforestation data on the internet. To encourage enforcement, a group at the Federal University of Mato Grosso plans to report on cases against the 60 largest deforesters.

A federal law passed last month “will change the rationale that leads to deforestation,” says Mr de Azevedo. Under the law, empty land will be preserved as “public forest”. Part of this—due after ten years to total about 3% of the rainforest—will be handed to forest-friendly companies through concessions; 6% will be reserved for harvesting by communities; and 12% will be turned into new conservation areas. A new forest service will manage the concession contracts; private certifiers will check that firms and government agencies are doing their jobs. Mr de Azevedo sees in this the end of a 500-year tradition of seizing and razing the forest.

But this vision is still a long way from being realised. A judicial and political backlash is likely. Despite provisions for “sustainable” forestry, Mr Tremonte is convinced that the government wants to drive loggers out, while Greens grouse that it is not doing enough. Although the environment ministry is eager to control the frontier, other ministries seem unenthusiastic. A recent bailout of struggling farmers, for example, did not require that they obey the environmental law. On the rescue of the Amazon, the government is clearly still of two minds.

terça-feira, abril 25, 2006

EVO MORALES E OS RECURSOS NATURAIS

Roda Viva

  • O Roda Viva de hoje trouxe uma entrevista com o presidente da Bolívia Evo Morales feita na sexta-feira passada em La Paz. O fato dos jornalistas brasileiros estarem desiludidos com o PT, Lula e a esquerda em geral, talvez não justifique a cobrança, frieza e até certa arrogância em relação a um presidente que assumiu um governo com os problemas que tem a Bolívia. Muito menos a idéia de defesa (sutil) da Petrobras face às críticas de Morales. Denúncias de que a Petrobras vem desrespeitando a legislação ambiental e os territórios indígenas em países como a Bolívia e o Equador estão no site amazônia.org.br e outros endereços internacionais dos movimentos indígenas todos os dias e há muitos anos. Seria muito útil se a imprensa brasileira aprofundasse esse tema sem preconceitos.

  • Fora esse sentimento de superior indiferença (ou dejà vu) que o Brasil sempre passa quando fala de outro país da América Latina, a entrevista foi muito boa. Ouvir um presidente dizer em claro e em bom som que o Estado precisa controlar a exploração dos recursos naturais para o país crescer é uma mensagem básica para a AL e muito difícil de ser inserida no modelo de desenvolvimento. Talvez esse esteja sendo o objetivo da Bolívia porque não conta com outra saída. Ou melhor, por isso mesmo tem até mais valor, porque poderia estar sendo exatamente o contrário - já que só tem natureza vamos acabar logo com ela em nome do desenvolvimento, como tem acontecido por aqui.

  • Uma das dificuldades certamente será enfrentar a pressão dos EUA. E o fato que noticiei aqui neste blog em fevereiro, da senadora boliviana Leonilda Zurita, que teve seu visto suspenso e não pode participar de um seminário na Universidade da Flórida - foi mencionado por Morales. Disse que solicitou aos EUA que informe antes a lista das pessoas que não terão visto para que não sejam humilhadas ao chegar no aeroporto e ter o visto cancelado na hora de embarcar como aconteceu com ela. Em troca dessa delicadezao, seu governo também vai apresentar a lista de norte-americanos que não serão bem-vindos na Bolívia.

  • Temas como estes serão objeto do curso que vou dar para a pós-graduação, na Universidade da Flórida, neste segundo semestre sobre "Amazônia: Políticas Públicas para Conservação e Desenvolvimento" (The Amazon: Public Policies for Conservation and Development). Será um curso sobre a Pan Amazônia, a Amazônia Continental, a Amazônia Internacional, ou seja todos os países amazônicos pensados juntos estrategicamente na formulação de políticas públicas de desenvolvimento e meio ambiente. Será também um curso estilo seminário porque todos os especialistas em Amazônia que lecionam na UF ( e talvez alguns de fora) serão convidados a dar um aula e eu vou fazer os ganchos e elos entre os temas. Certamente será uma experiência inovadora e vou aprender tanto quanto ensinar. Sugestões de temas, autores, idéias são bem vindas.

  • A grande questão que me atormenta neste tipo de debate em sala de aula, é até quando a sociedade americana vai continuar quieta, respaldando a política internacional de Jorge Bush. Não falo da do Iraque mas da América Latina. Será muito importante que os intelectuais americanos aprendam a criticar seu país e exijam a mudança das regras. Passamos vinte anos descobrindo formas de questionar uma ditadura, muitos morreram por causa disso, uma democracia foi conquistada e está se fortalecendo e consolidando. Enquanto a chamada maior democracia das Américas está calada! Somente quando os americanos saem dos EUA e visitam outros países é que percebem, como relatou uma aluna minha ao vir ao Forum Social Mundial em 2005, como são odiados e começam a se perguntar porquê. Qualquer mudança, hoje, na AL e no meio ambiente, depende muito do que a sociedade americana será capaz de fazer nas próximas eleições.

Altino Machado

  • Altino Machado que tem o blog mais rico que conheço, em informação e temas, reclama da minha ausência na blogosfera - fico mais de uma semana sem voltar ao meu blog! Mas Altino, que culpa eu tenho de não acontecer tanta coisa interessante aqui em Curitiba! Impossivel competir como Acre. Curitiba é uma gracinha de cidade, planejada, moderna, limpa e organizada. Gosto de tudo isso. Mas às vezes me pergunto: como conectar esses dois mundos tão distantes?

  • Na verdade, Curitiba vai se conectar com o Acre até o final do ano de uma forma surpreendente. Mas isso é surpresa - é um projeto que a Secretaria de Meio Ambiente vai implementar em memória de Chico Mendes. Conversa para daqui alguns meses. É por isso que não tenho tido tempo de blogar, Altino, estou envolvida nessa novidade.

  • Era eu que estava online no seu blog agora, 1:54. Até mais.

domingo, abril 23, 2006

NOTAS DA COP8















NOTAS

  • Comunidades na margem. O presidente do CNS, Manuel Cunha fez uma fala muito inteligente e organizada no painel que participou nos debates da Natura. Também deu importantes contribuições aos demais temas. Se dependesse da ONU, no entanto, lideranças como ele ficariam assistindo aos debates sentados no chão, sem microfone nem reconhecimento. (Foto 1)

  • Extrativistas na web. O seringueiro Julio Barbosa, ex presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros, ex prefeito de Xapuri e hoje assessor do governador Jorge Viana chegou no estande da Natura com pressa: queria ver seus emails. Quem acessou o site foi o castanheiro líder da RDS do rio Iratapuru, no Amapá Eudimar Viana. (Foto 2)


PUBLICAÇÃO

Publicação Natura COP8. Todas as falas e debates, inclusive o último painel sobre Biodiversidade: Conservação, Uso Sustentável e Responsabilidade Corporativa - Uma Agenda para o Futuro, estarão na íntegra na publicação que está sendo preparada. Aguardem para breve.

MERCADOS E SERVIÇOS AMBIENTAIS

















Painel 5: Gestão, Mercados e Políticas Públicas para Produtos Sustentáveis da Biodiversidade Brasileira.

1. Políticas públicas. Planex – Plano de Ação do Agroextrativismo. Políticas para o uso sustentável dos recursos extrativistas em áreas protegidas e fora de áreas protegidas, na Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado. Viabilizar e consolidar uma forma de desenvolvimento sustentável de baixo custo com benefícios sociais e ambientais amplos. Incluir na discussão: repartição de benefícios, educação e pesquisa. Integração entre pesquisa científica e sabedoria popular.

2. Problemas. Problemas de gestão nos empreendimentos comunitários – critérios mais definidos para alocação dos recursos. Dificuldades para se relacionar com o mundo empresarial.

3. Mercado. Mercado existe, mas os problemas são: custos de beneficiamento, qualidade do produto, riscos de não cumprir contratos. Não há crédito para o plano de manejo ou para financiar o investimento produtivo.

Painel 6: Valoração da Biodiversidade e Pagamentos por Serviços Ambientais: uma nova política para os países tropicais?

1. Mercado e/ou política econômica. Serviços ambientais pode ser um tema para o setor privado: consumidores pagam pela proteção como vem ocorrendo com produtos orgânicos.

2. Política econômica. Subsidiar o pequeno agricultor (ou comunidades dos povos da floresta) e não o produto. De onde vem o dinheiro? Impostos, taxas sobre carbono, fundo de proteção que redistribui benefícios, imposto mundial. Contratos do poder público com comunidades para proteção da fauna e/ou gestão das reservas. Projetos sócio-econômicos que podem servir como sumidouros de carbono.

3. Serviços e desserviços. Também se deve cobrar pelos desserviços ambientais e pagar pelo serviço: uso de forma não sustentável do capital natural. Equilíbrio entre o papel de contribuinte e de consumidor. Serviços Ambientais e CDB. Remuneração de acordo com a CDB – valoração sul-norte dentro do país; pagamento do sul ao norte pelos serviços prestados.

4. Preço justo. Definição do que é o preço justo, como avaliar a contribuição da comunidade. Rever e analisar casos de negociação já realizados, no Brasil e no exterior, discutir e fazer um balanço, calibrando as expectativas desde 92.

5. Comando e controle. Remunerar pela não destruição pode ser visto como um escândalo ou como essencial à conservação. Antes da valorização do uso é preciso ser capaz de implementar o comando e controle. Se alguém quiser pagar os serviços internacionalmente é possível que surja reação contra o risco de perder a soberania.

CDB VERSUS OMC


















Painel 4: CDB versus OMC e Lei de Patentes: um regime sui generis de proteção aos conhecimentos tradicionais é possível?

1. Coletivo e individual.
Contradições entre conhecimento coletivo e individual. Duas lógicas: circulação livre de informações e informações patenteadas. Lógica do patenteamento está indo tb aos povos indígenas. Lógica da CDB está se subordinando ao comércio. Proteção de direitos coletivos entra em um espaço de conflitos quando se insere no mercado, que somente reconhece direitos privados.

2. Internacional x nacional. OMC não distingue produtos com diferente valor ou com valor socioambiental agregado. Muitas vezes são mercadorias iguais com modos de produção diferentes. Por outro lado, a OMC tem sanções e mecanismos de implementação que a CDB não tem.

3. Posição do Brasil. A posição do Brasil na OMC é trazer a CDB para dentro da OMC – o patenteamento deve demonstrar que houve acesso a recursos genéticos. Havendo recursos genéticos e conhecimento tradicional é preciso demonstrar que foram acessados de acordo com normas do país de origem – houve chancela da lei brasileira – "disclosure of origin". Isso significa, por outro lado, conflitos com a regra de soberania: um país não pode obrigar que os outros países sigam suas leis.

4. INPI. Essa mesma proposta já deveria estar ocorrendo no Brasil: o Art. 31 da MP já exige comprovação pelo INPI, embora não esteja sendo cumprido pelo órgão patentário. Ministério Público expediu recomendação para o cumprimento.

5. CDB E OIT. Papel das comunidades tradicionais na implementação da CDB – valor meramente econômico é criticado. A Convenção 169 da OIT estabelece a soberania dos povos indígenas sobre seus conhecimentos e deveria ser a referência para a CDB.

6. Inovação. Velocidade no processamento da informação e o significado da informação. O Art. 8j aborda dois aspectos: sistema tradicional e inovação. Capacitar o país para valorar a informação - mas valor afetivo não existe no mercado.

7. Conhecimento partilhado. Evitar a competição entre grupos quando o conhecimento é partilhado criando formas apropriadas de repartição de benefícios. Áreas culturais, territórios, fundos para repartição coletiva de benefícios. Instrumento de identificação geográfica de origem.
Frases:
"Muitas vezes o que temos, mesmo, é o direito ao usis sperniandis" – Fernanda Kaingang.

sábado, abril 22, 2006

PARCERIAS EXEMPLARES
















Temas 3 e 4: Parcerias Exemplares no Uso Sustentável da Biodiversidade: a difícil tarefa de conciliar interesses.

1. Vantagens da parceria. A biodiversidade não é consumida em qualquer comunidade, não é consumido no local – a parceria é fundamental para acessar o mercado. Não podemos depender somente dos produtos utilizados para nosso consumo. A parceria elimina a figura do atravessador e as associações negociam com empresas. Parceria também contribui para a descoberta de novos produtos, para a melhoria na qualidade da produção; para agregação de valor na comunidade; apoio às comunidades para investir na melhoria de equipamentos e processo produtivo. Mas as comunidades não foram chamadas para discutir repartimento de benefícios.

2. Tradução cultural empresas-comunidades. Trabalho de tradução das características do setor privado para as comunidades. Melhorar a participação no mercado – é preciso outro modelo porque com o atual não funciona. Comunidades enfrentam o mesmo problema das empresas – desconfiança. Dificuldades: definir os interlocutores, no governo e na comunidade; evitar a dependência da comunidade à empresa em função da exploração de um único produto; comunidades têm que aproveitar a demanda pelo produto para se estruturar porque pode acabar. Construir uma teia de relações de confiança e transparência.

3. Critérios para boas parcerias. Parcerias não podem ser pensadas somente na produção; faltam políticas públicas; respeito ao modo de vida das comunidades; cadeia produtiva, não somente fornecedores de matérias-primas; sustentabilidade do processo – manejo; certificação; encontrar outros parceiros a partir de um; transparência entre as partes e definição clara de papéis; modelo diferente do convencional.

4. Andirobal do Marajó. Desequilíbrios entre as comunidades. Enquanto algumas têm territórios protegidos e desenvolvem projetos econômicos, outras têm seus recursos e territórios ameaçados. A andiroba é a base de sobrevivência e de saúde do Marajó; catam amêndoas no rio porque donos da terra não permitem acesso; prensas piratas - exploração nas prensas não implica em conhecimento tradicional; priprioca é uma lenda marajoara – quem decidiu usar o nome sem que eles recebam nada por isso? As comunidades não querem parceiros, querem sócios.

5. Ambigüidade das motivações. Analisar a ambigüidade das empresas: motivação comercial e responsabilidade social corporativa; aspecto de provedor e comercial; às vezes substituem o governo. Motivação das empresas interfere na comercialização e no formato. Falta de empreendedorismo e de capacidade de gestão.

6. Síntese. Princípios e fatores críticos de sucesso: (i) clareza – visão do projeto, qual o modelo de desenvolvimento, qual a visão de conjunto; (ii) definir metas e objetivos com clareza; (iii) acordar expectativas entre parceiros – definir o papel de cada parceiro; (iv) relação de confiança – poder brigar.

Frases:
"Aos troncos e barrancos, estamos avançando" – Manuel Cunha.
"As comunidades não querem parceiros, querem sócios". "Queremos ser tratados como animais em extinção" – Edna Marajoara


IMPLEMENTAÇÃO DA CDB, ACESSO E REPARTIÇÃO DE BENEFÍCIOS

















Tema 1. Implementação da CDB: desequilíbrios entre conservação e uso sustentável.

1. CDB x desenvolvimento convencional. Há equilíbrio na implementação da CDB (em termos de conservação e uso sustentável), mas as duas estratégias não conseguem fazer frente ao modelo de desenvolvimento predatório e à falta de planejamento nas intervenções governamentais. Embora exista maior consenso de que a conservação pode ser lucrativa e o conhecimento da biodiversidade pode influir positivamente na economia, os investimentos no desenvolvimento convencional continuam sendo feitos sem questionamentos.

2. Conservação e uso sustentável. Conservação é mais fácil de implementar por que implica em criar áreas protegidas; uso sustentável e distribuição de benefícios são mais difíceis porque faltam instrumentos de implementação para repartição de benefícios fora da esfera específica da área comercial. Repartição somente ocorre na esfera do comércio.

3. Empresas nacionais e internacionais. A CDB abriu as florestas para exploração pelas empresas dos países centrais - não existe, na Convenção, a idéia de que países com diversidade biológica (pobres economicamente) também detenham empresas de biotecnologia. É preciso ter benefícios para que possam ser repartidos. São as pequenas empresas tecnológicas, com contratos com as grandes, que detém 80% das patentes. As pequenas empresas atuam na ilegalidade porque nem todas conseguem cumprir as regras.

4. Povos indígenas. Os indígenas passaram de povos inúteis a gente que precisa ser consultada. Por isso criaram o Inbrapi – Instituto Indígena Brasileiro de Propriedade Intelectual - para não permitir que os recursos sejam surrupiados. A discussão da CDB é um engodo porque os povos indígenas estão nos bastidores. Universidades e empresas estão devendo a qualificação dos povos indígenas.

5. Avanços. É importante ressaltar que houve avanços: embora a CDB não tenha sido implementada, o Art. 8j virou pauta em outras convenções, houve uma ampliação da pauta convencional. Esse avanço se expressa na questão do regime internacional de repartição, ou seja, a idéia de que, para patentear, é preciso demonstrar o caminho do conhecimento tradicional associado, ou seja, um certificado de origem para o patenteamento.

Frases
"O homem do mundo do cheque não fala com o homem do tubo de ensaio" Antonio Paes de Carvalho.
"A mão oculta do mercado que nos acaricia vai acabar nos estrangulando" "Visão de Polyana - conseguimos que os índios sejam ouvidos – é pouco!" Nurit Besunsan.

Tema 2: Acesso e Repartição de Benefícios: é possível conciliar mercados, conhecimento tradicional e ciência?

1. Culturas diferentes. O debate está se dando entre culturas diferentes: indígena, acadêmica e industrial. No CGEN há um embate entre ciência e população tradicional. Há um dilema porque não estão sendo contruídas relações de confiança entre os membros do CGEN. O Brasil deveria estar na vanguarda nos acordos. Sugestões: olhar os exemplos internacionais: Sun Tribe (planta contra obesidade); Samoa e Instituto Nacional do Câncer dos EUA (Aids); mais imaginação. As comunidades indígenas devem ser vistas com parceiros científicos. E o Brasil deve criar casos paradigmáticos.

2. Conceitos diferentes. Conhecimento tradicional não tem perspectiva de mercado. Os detentores são os pajés que estão sonhando nas cachoeiras – a referência é o cara que está lá na aldeia. O conhecimento tradicional útil para o mercado é apenas uma parte, uma parcela, do conhecimento tradicional como um todo.

3. Implementação da CDB. Capacitação de formuladores de políticas, o que significa conhecimento prévio, conceitos são diferentes de grupo para grupo, formulação de políticas públicas específicas. Consentimento informado significa a possibilidade de dizer não. Necessidade de realizar especializações tanto em relação aos índios como aos brancos.

4. Confiança entre as partes. Para criar relações de confiança não se trata da necessidade das comunidades fazerem concessões – é preciso aventar a possibilidade das empresas fazerem concessões em relação aos seus lucros. Não precisa esperar legislação para fazer bons acordos – é preciso incorporar valores novos independentemente da legislação.

Frases: Lucio Flores (Terena)
"Dói na alma quando alguém fala em comercializar algo que é sagrado para nós".
"O processo não entende o índio – é preciso respeitar os processos indígenas."

sábado, abril 01, 2006

CICLO DE DEBATES DA NATURA - COP8

















UM BALANÇO

O ciclo de debates organizado pela Natura durante a COP8 tem uma estatística interessante: foram 52 pessoas que fizeram intervenções em 8 painéis sobre temas diferentes, do dia 20 ao dia 28 de março durante o tempo estabelecido para os eventos paralelos, ou seja, entre 1 e 3 da tarde e 6 e 8 da noite. Cada painel teve uma composição múltipla, com representantes de comunidades indígenas e tradicionais, setor privado, academia, governo, não governamentais e organizações internacionais.

Com uma platéia média de 30 pessoas por painel foram 210 pessoas no total que frequentaram a sala de debates (foto 1). Este público foi muito ampliado pela oportunidade de assistir às apresentações e debates na tela projetada no estande da Natura (foto 2).

Pela repercussão que alcançou, pelas pessoas que voltaram todos os dias para assistir, pelos comentários ouvidos nos corredores, acho que podemos considerar que a iniciativa foi um sucesso.

Grande parte deste sucesso resultou da qualidade excepcional dos painelistas. Para cada painel foram convidados os especialistas naquele tema. E o objetivo era que cada um pudesse expressar, em alto nível, a posição de seu grupo de interesse e ouvir, ao mesmo tempo, a defesa dos interesses de outros grupos. E cada um falou em nome de segmentos econômicos, políticos e sociais que, muitas vezes, atuam em campos opostos e em conflito. Para os ouvintes era uma síntese muito bem vinda e inteligente de debates que se diluíam na fluidez nas negociações oficiais.

Outra parte relevante do sucesso deve-se à capacidade de convocação e ao espírito da Natura – aberto ao diálogo e ao debate. Como afirmou a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha, "todas as empresas fogem da discussão sobre biodiversidade, enquanto a Natura a promove". E deve-se creditar exclusivamente à Natura a idéia de trazer para o debate os temas polêmicos associados à implementação da CDB, assim como de oferecer às pessoas um ambiente descontraído (e saboroso) antes e depois dos painéis.

Cabe um crédito, também, à metodologia - ao fato de que abolimos as distâncias entre as pessoas e os temas – sem powerpoint, sem projeções ou textos escritos. Apenas uma idéia na cabeça e um microfone na mão. Queríamos uma fala direta, focada em problema e alternativas. Buscávamos uma opinião e uma contribuição ao debate sem muitos adereços. O espaço - pequeno - e a ausência de distância entre os expositores e o público, também facilitaram a ciração desse campo opinativo.

Por último, acho que também podemos afirmar que as pessoas estavam querendo ouvir algo mais concreto para contrapor com as dificuldades das negociações oficiais. Pode-se concluir que, se o CGEN não tem conseguido resolver muitos dos problemas para os quais foi criado - como foi dito ao final dos debates - ao menos tem sido bastante útil em criar um campo de debate e forçar o aprimoramento dos argumentos.

Não pretendo fazer um resumo dos debates aqui. Organizei os pontos que mais me chamaram a atenção e, claro, há um bias nessa seleção, que eu assumo. Penso que seja relevante ter um mente tanto aqueles tópicos que podem permitir maior exploração no futuro quanto aqueles sobre os quais não existe consenso.